6 de agosto de 2023 | Luís Matheus Brito
Quando discutiu eficácia literária, Walter Benjamin apontou para uma alternância entre ação e escrita, separando, sem dúvida, um elemento que sempre esteve incorporado a outro. Escrever, pois, é uma ação.
Mas a posição de Benjamin, que nem sequer é descartável, requer o mínimo de contexto. No ensaio de abertura de Rua de mão única¹, ele chama a atenção para o engajamento que a literatura conclama na hora de superar a própria esterilidade, o que, para ele, desenvolve-se num “ambiente estritamente literário”. Ou seja, o literário — se quiser garantir efeitos numa comunidade — tem que caminhar lado a lado com o não literário; se possível, assimilando-o.
Para desfazer a esterilidade, Benjamin propõe: é preciso “cultivar e aperfeiçoar” suportes que subvertem “o gesto universal do livro”, como o panfleto, o artigo de jornal e o cartaz.
Em nosso caso, é a revista o meio que — mesmo tradicional — selecionamos para estender os efeitos tanto da literatura quanto de outras artes. A Tilápia-azul tem interesse na construção de um espaço dentro do qual a atividade artística não se desvincule da ação e do pensamento críticos, nem da experimentação — por mais que, assim, a afirmação soe como truísmo. É, no fim das contas, a construção de uma comunidade leitora o que está em jogo.
Desde o nome, o que pode se revelar como impulso para o trabalho desta publicação é a convivência com o que é estranho: sendo africana, afinal, a tilápia-azul é uma espécie não endêmica para nós; uma espécie estranha à fauna brasileira, mas que, mesmo estranha — estrangeira — outra, vê-se incorporada ao nosso ecossistema. Para o bem e para o mal, intervém na paisagem — para nós, a intervenção é de ordem artística e cultural, é claro.
Sobre os efeitos do estranhamento — do estranhamento que se revela graças ao contato com uma imagem ou um texto —, eis o que está no horizonte da Tilápia-azul; horizonte no qual não se negligencia o tempo de cada experiência.
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[¹] Rua de mão única : Infância berlinense : 1900, de Walter Benjamin (tradução de João Barrento; Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2017).
Mapas de Aracaju e São Cristóvão, 1958 (Fonte: Enciclopédia dos municípios brasileiros, IBGE)
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Luís Matheus Brito (1994) é poeta, ensaísta e mestra em Estudos Literários pela UFS (Universidade Federal de Sergipe). Publicou Guia de Queixumes (edições blague, 2021). Edita a Tilápia-azul.